Escrevendo em terceira pessoa eu finjo que não é sobre mim. Preciso inventar um eu fora de mim pra dizer o que o eu –de dentro- quer. O problema é que o eu- de fora – que se transforma em Ela, também é complicado. Ela é complicada. Se sente tão vazia quanto cheia de tudo. Tão triste e dolorida quanto indiferente e inexistente. É alheia e atenta, presente e distante. Ela
é cheia dos sonhos e não acredita profundamente em nenhum deles. Os preserva, só para ter algo pelo que lutar. Ela gosta de lutar e se sente derrotada. Tem pressa e quer que o tempo congele. Teme o futuro mais do que quase qualquer outra coisa, e anseia pela sua chegada. Tem à todo mundo e à ninguém. Ela é a sua segunda opção. Ela é o segundo plano. Se ela estiver lá, tudo bem; se não... bem, possivelmente ninguém notou.Ela se acostumou ao caos, e as têmporas são constantemente dilaceradas. No encontro do céu e do mar pela janela, ela vê a angústia. Se sente cansada, e quer simplesmente correr por aí. Ela sempre se confunde em suas decisões firmes. Ela é definitivamente provisória. Ou provisoriamente definitiva. Ela não me larga, e insiste em morar em mim. Mas escrevendo em terceira pessoa eu posso fingir que não é comigo.

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